Alienação fiduciária: o que o STJ tem decidido sobre o tema 2
postado em 26/07/2012
Cancelamento de financiamento por arrependimento
Os casos em que o adquirente do bem se arrepende e quer cancelar o financiamento também podem parar no Judiciário. A Terceira Turma entendeu ser possível o consumidor exercer o direito de arrependimento nas compras que faz, após a assinatura de contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária. Na decisão, o colegiado aplicou as normas do consumidor à relação jurídica estabelecida entre um banco e um consumidor de São Paulo.
O banco ingressou com pedido de busca e apreensão de um veículo pelo inadimplemento do contrato de financiamento firmado com o consumidor. Este alegou que exerceu o direito de arrependimento previsto no artigo 49 do Código do Consumidor e que jamais teria se imitido na posse do bem dado em garantia. O Tribunal de Justiça estadual entendeu que a regra era inaplicável no caso, pelo fato de o código não servir às instituições bancárias.
Seguindo voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, a Turma reiterou o entendimento quanto à aplicação do CDC às instituições financeiras e considerou legítimo o direito de arrependimento. Segundo ela, o consumidor assinou dois contratos, o de compra e venda com uma concessionária de veículos e o de financiamento com o banco. Após a assinatura do contrato de financiamento, ocorrido fora do estabelecimento bancário, o consumidor se arrependeu e enviou notificação no sexto dia após a celebração do negócio.
“De acordo com o artigo 49, o consumidor tem sete dias a contar da assinatura do contrato para desistir do negócio, quando a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial.”, acrescentou.
Liquidação junto ao banco
Empresa de seguros não pode ser responsável pela liquidação de sinistro junto ao banco. Com esse entendimento, a Quarta Turma manteve decisão (REsp 1.141.006) que rejeitou a alegação de ilegitimidade passiva do banco em ação proposta por um espólio e negou pedido de denunciação à lide de uma seguradora.
No caso, o homem firmou um contrato de abertura de crédito com alienação fiduciária junto ao banco Fiat, a fim de adquirir um automóvel. Na ocasião, a celebração do contrato foi condicionada a adesão do consumidor à apólice de seguro da seguradora, pertencente ao mesmo grupo econômico do banco, a qual, em caso de óbito, providenciaria a quitação integral do veículo financiado.
Menos de um ano depois da aquisição do veículo, ele veio a falecer, mas houve negativa de cobertura, ao argumento de que a sua morte ocorrera devido à doença preexistente. Em seguida, o espólio propôs ação diretamente contra o banco, visando à transferência do veículo e à restituição das parcelas pagas indevidamente, no valor de R$ 1.082,76.
No STJ, o banco alegou que a empresa de seguros é responsável pela liquidação do sinistro junto a ele, estando obrigada a indenizar, em ação regressiva, o seu eventual prejuízo, motivo pelo qual obrigatória a denunciação à lide.
Segundo o relator, ministro Luís Felipe Salomão, nem pela lei, nem pelo contrato, há direito do banco de se ressarcir da seguradora. Para ele, não há vínculo contratual nem legal entre as duas pessoas jurídicas. Dessa forma, é incabível eventual pretensão regressiva do banco contra a seguradora, pois, em tese, apenas os autores poderiam ajuizar ação direta contra a seguradora para exigir o cumprimento do contrato de seguro, se assim optassem.
“Portanto, não se trata aqui de garantir direito de regresso do denunciante em face da denunciada, pois a seguradora não está obrigada, seja por lei, seja por contrato, a garantir o resultado da demanda. Os fundamentos que levaram a seguradora, que, repita-se, firmou contrato apenas com a autora, a negar o pagamento do prêmio, sequer estão sendo discutidos na defesa da ação principal”, destacou.
Carro financiado com defeito
Ao julgarem o REsp 1.014.547, o STJ decidiu que a instituição financeira não é responsável pela qualidade do produto adquirido por livre escolha do consumidor mediante financiamento bancário. Com esse entendimento, a Quarta Turma reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) que condenou um banco em processo envolvendo a compra de um automóvel.
No caso, a consumidora comprou uma Kombi ano 1999/2000 na empresa Baratão dos Automóveis, instalada no Distrito Federal, com financiamento concedido pelo banco, em 36 parcelas. Como o veículo apresentou uma série de defeitos dentro do prazo de garantia de 90 dias, ela devolveu o veículo e ajuizou ação de rescisão contratual com pedido de indenização por danos morais contra a revendedora e a instituição financeira.
O TJDF rescindiu o contrato de compra e venda e o financiamento e os condenou, solidariamente, a restituir as parcelas já pagas ao banco. Também condenou a empresa de veículos ao pagamento de indenização de R$ 10 mil por danos morais. Para o tribunal, o contrato de financiamento é acessório do contrato de compra e venda, portanto devem ser rescindidos conjuntamente.
O banco recorreu ao STJ alegando que o financiamento é distinto do contrato de compra e venda firmado entre a consumidora e a empresa revendedora e que os defeitos alegados são referentes ao veículo, não caracterizando qualquer irregularidade na prestação do serviço de concessão de crédito. Sustentou, ainda, que por não ter relação com a revendedora o contrato deve ser honrado.
O relator, ministro João Otávio de Noronha destacou que não é licito ao devedor rescindir o contrato e reaver as parcelas pagas de financiamento assegurado por alienação fiduciária, alegando defeito no bem adquirido. Para ele, embora o artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) admita a rescisão do contrato de compra e venda de veículo usado, o mesmo não ocorre com o contrato de mútuo, já que a instituição financeira não pode ser tida como fornecedora do bem que lhe foi ofertado como garantia de financiamento.
O ministro ressaltou também que as disposições do CDC incidem sobre a instituição financeira apenas na parte relativa à sua atividade bancária, acrescentando que, quanto a isso, nada foi reclamado. Ele entendeu que, no caso em questão, o banco antecipou dinheiro à consumidora, que o utilizou para comprar o automóvel, sendo certo que o defeito do produto não está relacionado às atividades da instituição financeira, pois toca exclusivamente ao revendedor do veículo.
Por fim, o relator destacou que, ao contrário do entendimento firmado pelo tribunal de origem, o contrato de financiamento não é acessório do contrato de compra e venda, já que os contratos não se vinculam nem dependem um do outro. Com esses argumentos, acolheu o recurso para declarar o contrato celebrado entre as partes válido e eficaz em todos os seus efeitos.
FONTE: http://www.stj.jus.br/portal_